Non scholæ sed vitæ discimus

domingo, 21 de agosto de 2022

O Povoamento do Maciço do Baturité

Sítio Coité, Aratuba-CE.

Logo a sudoeste da Fortaleza capital do Ceará não mais do que 60 Km em linha reta até sua parte norte demora uma vastíssima região serrana contando atualmente 05 (cinco) municípios em suas paragens mais elevadas.

- Palmácia, a antiga Palmeira, a caçula das urbes, cujo patrimônio ao seu orago São Francisco de Assis for doado por Idelfonso Ribeiro Campos, trineto do casal Antonio Domingues Alves e Agostinha da Silva Carvalho, fundadores da atual Boa Viagem e imortalizados nas memórias do Profº Ximenes de Aragão, dentre outros mais insignes cronistas cearenses.

- Pacoti, antiga Pendencia, bem mais recente;

- Guaramiranga, outrora Conceição;

- Mulungú, Sítio Mulungú 

- Aratuba, anteriormente Coité e Santos Dumont.

Serra imensa com clima salubérrimo de pouca amplitude térmica com temperaturas médias atuais nos meses de estiagem de 25ºC e no período chuvoso e imediatamente após nos meses julho-agosto de 18ºC, sendo registrada a mínima absoluta de 11,7ºC em monitor de alta precisão em estação meteorológica automática alemã marca R. Fuess localizada no sítio Flexeiras no município de Aratuba, sendo considerada nesta medição a sensação térmica obtida eletronicamente, pois, compensadas a velocidade do vento que lá dardeja por todo ano, comumente a umidade relativa do ar.

Terra de nascentes de riachos e rios, corredeiras, cachoeiras com abundantes pastos nos sopés. Desde o século XVII tem sido a serra do Baturité verdadeira taboa de salvação para as mais distintas gerações de sertanejos do nosso sertão central e setentrião, oásis salvador nas repetidas secas que constantemente dizimaram os planteis de gado vacuum e cavalar. Costumamos dizer que quase todos nossos ascendentes já se encontraram alguma vez no Baturité. 

Desde priscas datas têm sido recorrentes as discussões sobre qual a primeira urbe na cumeeira da Serra do Baturité.

Historiadores e genealogistas como os eminentíssimos e percucientes Pedro Catão e Vinícius Barros Leal dentre outros historiógrafos e cronistas de escol muito se debruçaram sobre o tema, sem embargo, não conseguiram estadiar este enigma.

Entrementes foi Guaramiranga, a antiga vila da Conceição, por sua proximidade com o Baturité, cidade polo, comumente por ser sede do veraneio das famílias mais proeminentes do Ceará ao longo de décadas foi a que despontou economicamente no ínterim do séc. XIX e, desde então, a mídia com toda justiça divulga à saciedade seus encantos, sua exuberância paisagística, quase idílica e a excelência do seu clima. Respeitável infraestrutura turística foi criada para atender seus visitantes. Não sem razão Guaramiranga reclama sua primogenitura.

Aconteceu que nas proximidades da atual cidade do Baturité pé da serra a 140 metros acima do nível do mar, aos 07/10/1735 o Ten Cel Manuel Duarte da Cruz, o Sgt-Mor Lopo Barbosa Maciel e Pedro da Rocha Maciel receberam uma carta de sesmaria nestes termos:

Três Léguas de terra no Riacho chamado Candeia que nasce na Serra Baturité e desaguando no Rio Aracoiba e que eles suplicantes descobrira, terras lavradias”.

A descrição é clara de área plana de vazantes, não faz nenhuma menção ao cimo da Serra.

Até aqueles que pouco conhecem a região pueril constatar a inexequibilidade de antingir pelo menos a cota de 400 metros (asl) via o vale do Candeia ou ainda pelo riacho Sinimbú! O que dizer então naqueles idos de 1735 tendo em vista a densidade da mata que de ordinário se formava muito mais espessa à barlavento!?


                  Conceição - Guaramiranga


<<Quando se estabeleceu na região, em fins de 1853, João Batista encontrou um “deserto, havendo apenas ruínas e taperas de sítios antigos.” No ano seguinte, construiu a primeira residência. Menos de dez anos depois, onde havia somente abandono, encontrava-se um povoado de trinta casas, sendo a maior parte coberta por telhas, ao contrário das palhas utilizadas em habitações mais pobres. Se havia um arremedo de civilização naqueles confins do império de dom Pedro II, era graças ao esforço de João Batista. Nascido em Quixadá, em 28 de setembro 1824, pertencia pelo lado materno a antiga família Queirós, que se estabelecera no Brasil ainda no século 17. Numa viagem ao sítio Macapá, no alto da serra, pertencente ao tio tenente-coronel Antônio Francisco de Queirós “Jucá”, João Batista descobriu a riqueza da plantação de café, que havia poucos se tornado o principal produto de exportação do país. Sabendo da existência do sítio Guaramiranga, vizinho ao Macapá, e abandonado por seus tios Bento Joaquim de Andrade e Francisca Teresa de Lima, decidiu comprá-lo, em 26 de julho de 1853. A escolha fora motivada por razões além de econômicas. Em 22 de julho de 1847, havia casado com sua prima Joana Antônia de Jesus (Joana Batista de Queirós Lima, após o matrimônio), filha de Jucá.

Apesar de fundador da cidade de Guaramiranga, povoando permanentemente a região, João Batista não foi o primeiro a se estabelecer no alto de Baturité. Em 1809, seu tio, Miguel José de Queirós adquiriu um pedaço de terra, desmembrado do sítio Macapá. Chamou-o de Conceição. Assim como todos os demais que viriam mais tarde, Miguel fora impelido a emigrar pelas secas devastadoras do sertão cearense. Ao contrário de outras propriedades agrícolas no Ceará, as terras na serra do Baturité não eram provenientes de sesmarias concedidas pelos reis portugueses, em tempos coloniais, mas através de posses, separadas por riachos. Apesar de inúmeras tentativas, nenhuma das propriedades vingaram, sendo deixadas ao esquecimento. Até mesmo o pioneiro Miguel José, graças a invernos mais ricos, retornou as suas terras de criação de gado. Vendeu o Conceição para Francisco Félix, que, endividado, revendeu-o para Vitoriano Correia Vieira, que posteriormente o passou a Francisco Pinto Brandão. É deste sítio que proveio o nome do vilarejo fundado por João Batista, e que mais tarde se tornaria conhecido como Guaramiranga>>. (Nosso grifo).

- Resumèe histórico acima é de autoria do eminente pesquisador, o Dr. Licínio Nunes Miranda. 


Sobre o povoamento do Baturité equivoca-se flagorosamente o sempre abalizado Dr Vinícius Barros Leal na sua mais importante obra: A História do Baturité (Época Colonial), ao caucionar,  i.v.:   

“(...) Lá em cima, na parte mais elevada, correspondendo às localizações das atuais cidades de Mulungú, Guaramiranga e Pacoti, muito tardou a visita ou a instalação do colono branco. Na Conceição, (Guaramiranga), deu-se a ocupação mais precoce, com a instalação do sítio Macapá pelo Capitão João Rodrigues de Freitas, ainda no século XVIII, nos anos finais dos setecentos[1](...)” (Grifos nossos).

[1] Já em 1747, isso mesmo, 1747, portanto mais de meio século antes, o lugar  Pindoba, cota superior a 670 metros (asl) o qual demora circunscrito ao perímetro do município de Aratuba já era razoavelmente povoado, posto que residência do Capitão Pedro da Rocha Maciel e esposa,  D. Maria da Rocha e filhas do casal! Lá residiam também Tomás da Costa Pereira e sua mulher, D. Maria Pereira da Silva, ambos com numerosa família. Todos brancos! – Possuímos documentação probatória coeva e blindada à prova dos acadêmicos paulofreirianos.

“(...) Há indicio apenas de ter sido habitada essa zona por uma ou duas famílias de índios. Outro sítio na mesma zona, ocupado por Manuel Coelho Fraga foi avaliado, em 1773, por doze mil e seiscentos réis. Às margens do riacho do Cedro[2] instalou-se um colono em suas <terras brutas> e outros mais, especialmente os da família Pimentel, potiguares que ficaram nas quebradas, mais ou menos na altura do atual Olho d'água dos jesuítas e do São Miguel, da família Arruda. Nas Bananeiras e Pindoba e, mais distante, na serra dos Cajuais logo mais floresceram núcleos populacionais de relativa importância.(...)” (Nosso destaque).

[2] Certamente o autor não sabia a localização do riacho do Cedro, vez que muito longe das “quebradas”, pois corria nas cumeeiras da serra do Baturité, nascendo na altura do perímetro urbano da Aratuba 950 metros (asl), a oeste do sítio Coité, dali tomando rumo nordeste atravessando quase toda extensão do antiquíssimo sítio Flexeiras do Cap Antonio Ferreira da Cruz 850 metros (asl), indo fazer barra no riacho Canabrava na altura do sítio Araticum já no município do Mulungú, dai formando o riacho Nilo que junto ao riacho do Meio se constituem nos principais tributários do Putiú. 

Inexequível estadiar aquilo que nos quer ensinar o autor, posto que...

“(...) No século seguinte, até 1820, pouco progresso houve no avanço serra acima. Depois desta data, no entanto, aconteceu uma verdadeira corrida, especialmente após a introdução do café, em 1824, coincidindo com a chegada de algumas famílias transplantadas de Quixadá, para o coração da serra. Queroses e Holandas foram estes desbravadores destemidos, homens fortes e saudaveis. A tradição popular, até o começo do presente século guardava a lembrança da tenacidade e energia desses homens corajosos e, sobretudo, portadores de um verdadeiro espirito de pioneirismo(...)” (Grifos e destaques nossos)

- Mas como assim desbravadores (pioneiros)!? Se o Cap Antonio Ferreira da Cruz em seu sítio Flexeiras ue havia por descoberto no cimo da serra do Baturité 867 metros (asl), além de Pedro da Rocha Maciel, Tomás da Costa Pereira, Francisco do Rego Barros, Agostinho Leitão, José Leitão, Leão Amorim de Sá, Inácio José Teixeira, Antonio José Moreira Gomes, Brás Ferreira, Vicente Rodrigues Chaves...Todos retro mencionados acompanhados de suas profusas famílias já habitantes desde meados do séc. XVIII nas cotas superiores a 850 metros (asl) na serra da Pindoba onde hoje os sítios e localidades da Aratuba das Flexeiras, Canoés, Segredo, São João, Aningas, Mundo Novo, Barreiros, Cantinho, Gameleira, Matas, Cubículo (Cuvico), Calembé (Calembre), Caipora, Tamanduá...


                            O Coité - Aratuba 


                          Engenho e aviamento do Sítio Flexeiras. Aratuba-CE.
                          Uma das mais antigas edificações rurais em Aratuba


Diametralmente oposta as características orográficas da carta sesmeira de 1735 do Ten Cel Manuel Duarte da Cruz é a data de sesmaria concedida a Teodósio de Pina e Silva em 1736, a qual, corresponde ao exato landscape da Aratuba, senão vejamos:

"Diz Teodósio de Pina e Silva(b) morador nesta capitania que ele descobriu um Brejo que nasce da Serra do Baturité da parte do poente onde tem a dita serra uma abertura que mostra a pedra de cor amarela cujo brejo se chama pela língua do gentio Coité e tem o dito brejo um pé grande de coité que corre para a parte do Rio Choró".

A pedra de “cor amarela” indubitavelmente é a um dos muitos rochedos do cinturão granítico localizado no contraforte oeste da Aratuba, praticamente dentro da sua zona urbana, pois, ao divisar-se a serra desde o poente para o nascente considerando o horário vespertino, a refração da luz solar no óxido de ferro daquelas rochas nos dá a nítida impressão de amarelo vivaz.

Mais...

As encostas do poente da serra são sobremaneira menos íngremes em relação ao da sua encosta nascente via o Baturité, pois, possuem o componente -mata densa- posto que a vegetação ali principalmente no verão é rala e escassa. De ordinário, aqui, acolá, veem-se pés de barrigudas, mulungus, juazeiros, caroás, aroeiras, umbuzeiros.

Ainda...

O Coité (Crescentia cujete) cujo fruto muito usado para cuias, panelas improvisadas e cantis é árvore por demais exigente, frutificando em terras vermelhas, úmidas e ricas em matéria orgânica, não suportando estiagens prolongadas, enfim, tutti-quanti lhe é negada pela fornalha sertaneja à sotavento da Serra do Baturité. Ipso-facto somente nos cumes da serra, nas imediações da atual sede do município da Aratuba este “pé grande de coité” que se refere o sesmeiro Teodósio Pina e Silva poderia ser encontrado.

De mais, mais, o topônimo Coité gênese da Aratuba segue pari-passu à criação do imóvel rural do mesmo nome, que nos ocuparemos adiante no decorrer desta postagem.

Assim é a Aratuba de modo soberano e irrefragável a filha primogênita dos altiplanos do Maciço do Baturité!

As culminâncias da Serra do Baturité em suas mais expressivas partes foram ocupadas pelos sertanejos que vieram desde o sotavento, exatamente dos sertões das ribeiras ressequidas do Cangati, Canindé, Batoque, Caxitoré e Curú, ato contínuo, ádvenas dos mais recônditos sertões do Quixeramobim.

É que aquela vista clorofilada das cumeeiras desde o mormaço infernal daqueles sertões sobremaneira fascinaram o sertanejo. Abaixo, a guiza de ilustração, trazemos transcrição de procuração retirada de incontáveis documentos públicos da época de moradores no Canindé escriturados no Baturité.

“Procuração bastante que faz Ana de Freitas da Costa as pessoas declaradas = Saibam quantos este público instrumento de poder de procuração para sua validade e melhor nome haja dizer e chamar e possa virem que sendo o ano de nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil oitocento e quatro, aos vinte e seis dias do mes de julho do dito ano nesta Real Vila de Monte Mor o Novo da América Capitania do Ceará Grande em meu escritório apareceu presente Ana de Freitas da Costa moradora no Sítio da Conceição ribeira do Canindé(a)(...)”

(a) Não sem razão os registros de terra realizados a partir da Lei Imperial numero 601 de 18/07/1850 consigna inúmeras propriedades na Serra do Baturité realizadas no Canindé.

Tendo nós contabilizados muito mais passado do que futuro neste vale de lágrimas, lembramos que ainda no final da década de 60 e início de 70 transacto trazíamos um copo de ágata para tomarmos água nos 06 (seis) distintos olhos d’água que demoravam na subida da ladeira neste segmento da rodagem que ligava o Canindé à Aratuba subindo pela rampa da fazenda Marés.

Ascendíamos a serra desde aqueles sertões vindos da Fazenda Santa Cruz(b), igualmente via a ladeira “Pedestres”, assim crismada, pois, servia aqueles que iam a pé ou nos lombos da animália. Tracejando o mesmo retrocitado caminho no lugar agonia, onde as composições de rochas fechavam a estreitíssima vereda havia uma fonte de d’água com exuberante fluxo.

Malgrado de todos nós, nenhuma, sequer uma única fonte restou.

b) A fazenda Santa Cruz propriedade do Capitão Antonio Ferreira da Cruz adrede comentado. Importante, pois local do 1º casamento civil da Aratuba. Casamento 01 do livro de casamentos 01.   

Este caminho, de ordinário, era parte do percurso, o mais antigo, que ligava a então fulgurante Vila do Baturité ao povoado do Canindé já em meados do séc. XVIII.

Outro acesso para subir-descer a serra para aqueles sertões era feito através da ladeira do sítio Fernandes, sem embargo muito alcantilado, todavia o mais curto e onde foi implantada a atual rodovia CE-257 ligando a Aratuba ao Canindé.

Opção distinta era o sendeiro palmilhado a pé ou por animal que ia desde o sítio Tope, atual distrito da Aratuba até uma enorme reta que cortava a fazenda Longá que nos conduzia até a altura da fazenda Transvaal ao largo da serra do Pindá já nos outskirts do Canindé. O mormaço deste caminho dos mais infernais. A desidratação é certeira. 

Praticamente incogitável o trajeto Canindé a Baturité via o Mulungú através da quase vertical estrada do Camará. Do Canindé rumava-se à nordeste em procura da Ipueira dos Gomes, e no mesmo rumo a fazenda Serrote, e dali ao Mulungú via a escarpadíssima estrada do Camará  retromencionada.

Aqui o esboço em rápido bosquejo dos caminhos que legam sertões aos píncaros da serra.


           O Capitão Antonio Ferreira da Cruz


- E o caminho desde o Coité nas cumeeiras daquela serra até o Baturité?

- E para que se prestava o Coité neste percurso?

Ora, não havia percurso mais natural, mais curto, mais rápido e mais lógico para unir as duas maiores e mais importantes vilas daquela mesorregião, Baturité e Canindé, senão pelo roteiro que fazemos seguir.

Desde a Aratuba rumava-se em rota N-NE até o sítio Coquinho entrando pela antiga rodagem que ligava Aratuba ao Mulungú até o sítio Aningas. Das Aningas rumava-se NW até topar na atual rodovia CE-065 quase na entrada da estrada vicinal para o Sítio Segredo. Deste ponto seguindo rumo NE atravessando quase todo o miolo do sítio Flexeiras do Capitão Antonio Ferreira da Cruz(1) prosseguindo em caminho de -passa dois- até a extrema dos sítios Flexeiras e Cantinho que se formou por desmembramento do sítio Araticum, propriedade antiquíssima de Francisco do Rego Barros já habitada bem antes de 1804(2)(3), rumava-se dali via os sítios Gameleira e Matas até o Sítio Pindoba(4), o qual jaz circunscrito ao perímetro do município da Aratuba.

Da sede da Aratuba até a Pindoba neste trajeto apenas 6,4 Km.

Desde a Pindoba vadeava-se o rio Putiú passando pelo lugar Bananeiras e, logo em seguida o Sítio Jordão. Deste último alcançava-se o centro da então Vila de Monte-Mor o Novo da América, Baturité num percurso de apenas 5,5 km. Este caminho é indiscutivelmente o de menor inclinação, o mais curto, comumente o mais rápido.


Cap João Ferreira da Cruz

Bisneto do pioneiro Cap Antonio Ferreira da Cruz

(*05/03/1856, Flexeiras e  +29/09/1919, Flexeiras)



[1] O Cap Antonio Ferreira da Cruz, nosso quinto avô materno, (*c.1740) natural das várzeas do rio Capibaribe, atual bairro da Várzea no Recife-PE., filho do raiano de Verin, Manoel Ferreira da Cruz e Teresa Maria de Jesus. O Cap Antonio Ferreira da Cruz casou-se com Caetana Maria dos Reis, potiguar, filha legítima de Caetano de Oliveira e Rufina Antunes de Abreu, ambos da cidade do Natal-RN.

Do Cap Antonio Ferreira da Cruz e Caetana Maria dos Reis, o Cap Antonio Ferreira da Cruz, Jr. nascido no Baturité aos 10/12/1777 e falecido em seu sítio Flexeiras na Aratuba aos 08/12/1853.  

Experimentamos aqui enorme gáudio pelo privilégio em transcrever, verbo ad verbum, o registro de uma das mais antigas propriedades e possivelmente o documento de primogenitura quiçá do mais antigo habitante dos pináculos do Maciço do Baturité. 

“Escriptura de venda de parte de hu sítio de terras de plantar que faz o Alferes Antonio Ferreira da Cruz morador nas Flexeiras a Francisco do Rego Barros morador no Ariticú como abaixo declarão = Saibão quantos este publico instrumento de escriptura de venda virem e para sua validade e melhor nome haja dizer e chamar e possa virem, que sendo o anno de Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil oitocentos e quatro, aos sete dias do mes de julho do dito anno nesta Real Villa de Monte Mor o Novo da América Capitania do Ceará Grande, em meu escriptório, aparecerão presentes as partes contrahentes, outorgantes e bastantes, a saber, o Alferes Antonio Ferreira da Cruz morador no sítio Flexeiras Serra da Pindoba como vendedor, e como comprador, Francisco do Rego Barros morador no Ariticú termo desta Real Villa, próprios de que faço menção, pessoas que as reconheço maiores de vinte e cinco annos que dou minha fé por eles e me foi dito diante da presença das testemunhas adiante no fim deste nomeadas e assignadas que entre os mais bens que possuia de mança e pacifica posse e bens de rais sem contradição de pessoa alguma que ele é senhor e possuidor de hua sorte de terras de plantar no lugar Flexeiras termo desta Villa o qual sitio extrema na parte de cima com hua lagoa alcançando três pés de limoeiro indo extremar no riacho que lhe atravessa vindo do sul até hu pé de jatobá que fica adiante com todas suas matas, fruteiras, olhos d’ágoa, riacho que se achão no dito sítio e casa de vivenda entre as demais casas com todos seus pertences por hua outra parte do rio o qual o dito vendedor havia por descobrimento e que ele vendedor vendia como de fato vendido tinha de hoje e para sempre a Francisco do Rego Barros pela quantia de quinze mil reis em dinheiro decontado em moeda corrente deste Reino de Portugal o qual já havia recibido da mão do dito comprador de que eu tabelião dou fé por ter ouvido e declararem os ditos vendedor e comprador e que lhe dava plena e legal quitação de paga e para em tempo algum lhe ser mais pedida para si e outros herdeiros ascendentes e descendentes e que apos deles vierem e que dado sitio pode o dito comprador tomar posse por si ou por autoridade de justiça, quer a tome quer não o havia desde agora a posse natural, corporal, cível e real, pela cláusula constante omittia de si toda a posse, domínio e (ilegível por tinta permeada) útil e usofruto que no dito sítio tinha e podia ter de si apartava e transferia e ratificava da pessoa dele comprador para que goze e possua como dele ficava sendo de hoje e para sempre pela dita venda e compra que era feita sem constragimentos de pessoa alguma, mais foi dito pelo dito vendedor que se obrigava por sua pessoa e bens havidos a tirar ele comprador após a salvo toda e qualquer dúvida  contra a validade desta escriptura se faltava alguma cláusula ou cláusulas (ilegível) havia por (ilegível por furo na página) e declaradas como decididas e que fica menção e, declarada menção e pelo dito comprador foi dito que aceitava esta escriptura de venda com todas as clausulas e condições declaradas e em testemunho de verdade assim outorgavão, pedirão, aceitavão e mandarão fosse feito o presente instrumento nesta nota a qual fis por me ser distribuido pelo juiz ordinário Carlos José de Oliveira e que todos assignavão depois de lida acharão conforme ao que tinham dito e ditado sendo presentes por testemunhas o Capitão Mor Antonio Pinto Borges, Inácio Joaquim da Silva Braga, todos moradores nesta Real Villa, pessoas todas de mim reconhecidas maiores de vinte e cinco annos, de que dou minha fé e que tão bem afirmarão depois de lida e declarada. Eu Antonio José de Vasconcellos tabelião do público e notas nesta dita Villa me assigno” (destaques e grifos nossos)

Mais tarde, o registro do mesmo sítio Flexeiras por força da Lei Imperial nº: 601, de 18/07/1850 dispondo sobre as terras devolutas do Império.

Lei que teve sua formulação com o desiderato de sanear os imóveis possuídos por titulo de sesmaria sem o devido preenchimento das condições legais, como é o caso da quase totalidade das terras que se encontram circunscritas aos perímetros dos municípios do cume da Serra do Baturite, vide a sesmaria nº: 57 de 17/11/1736 de Teodósio de Pina e Silva.  

"No. 58:  Manoel Ferreira da Cruz possue na serra d'esta Freguesia do Baturité um sítio denominado Flexeiras* no sentido do dorso, que houve por herança do seu finado pai Antonio Ferreira da Cruz extremando da parte do Norte com terras dos herdeiros de Manoel José Martins, e da parte do Sul com Antonio Alves de Barros, da parte do Poente com Manoel Saraiva Leão e da parte do Nascente com João José D'Almeida. Baturité 25 de fevereiro de 1856. Manoel Ferreira da Cruz. Vigário Raimundo Fernandes Ribeiro".



             Casa grande do sítio Flexeiras após incontáveis reformas sécs XIX e XX

 

(*) O sítio Flexeiras possui larga tradição na produção do Coffea arabica de alta pureza.   

(2)  “Declaração de uma doação a Inácio Teixeira por seu sogro Francisco do Rego Barros = Saibam quantos este público instrumento de papel de doação virem ou para sua validade e melhor nome haja dizer e chamar e possa virem que sendo o ano de nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil oitocentos e quatro, aos sete dias do mes de julho do dito ano nesta Real Vila de Monte Mor o Novo da América Capitania do Ceará Grande em meu escritório apareceu presente Inácio José Teixeira, próprio de que faço menção e dou minha fé por ele me foi apresentada uma petição com um papel de doação cuja petição de verbum ad verbum é o seguinte: Senhor juiz ordinário, diz Inácio José Teixeira morador no sítio Araticum(a) serra da Pindoba deste termo que para efeito do suplicante casar com Inocência Maria filha de Francisco do Rego Barros morador do mesmo lugar fizera-se doação a mulher do suplicante” (nosso destaque). 


a) Ariticú. O Araticum da Mata Atlântica (Annona sylvatica), i.e.: Ata, Pinha, Fruta do Conde. O Sitio Araticum era imenso, circunscrevendo os atuais sítios-lugares aratubenses do Cantinho, Lagoa, Japão, Souza, Silva, Matas... No Mulungú, o distrito do  Catolé e o sítio do mesmo nome, Araticum.

(3)  “Escritura de venda de um sítio de terras no Araticum que faz Francisco do Rego Barros a Agostinho Leitão(b) = “Saibam quantos este público instrumento de escritura de venda virem ou para sua validade e melhor nome haja dizer e chamar e possa virem que sendo o ano de nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil oitocentos e quatro, aos dezesseis dias de julho do mesmo ano nesta Real Vila de Monte Mor o Novo da América Capitania do Ceará Grande em meu escritório apareceram presentes as partes contraentes, outorgantes e solicitantes a saber vendedor Francisco do Rego Barros morador no Araticum deste mesmo termo e da outra como comprador Agostinho Leitão morador no Araticum deste mesmo termo próprios de que faço menção e dou minha fé”

(b) Agostinho Leitão ascendente dos atuais proprietários do Sítio Cantinho, o Sr. Aluísio Leitão e família.

- Importantíssimo documento retro que demonstra a posse desta propriedade na mesma família por mais de 200 anos! Raríssimo no Brasil, máxime no Baturité onde os imóveis eram dados em hipoteca para financiar a agricultura sendo quase sempre liquidados pelos credores, quer pela hipossuficiência financeira dos agricultores ou pelos juros extravagantes praticados. O factório dos judeus franceses irmãos Fréres -Boris Fréres- nada perdoava;

(4)  “Escritura de um sítio de terras de plantar que faz Antonio da Costa Vieira morador na Serra da Uruburetama a João Teixeira da Silva como abaixo declara = Saibam quantos este público instrumento de escritura de venda virem ou para sua validade e melhor nome haja dizer e chamar e possa virem que sendo o ano de nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil oitocentos e quatro, aos vinte e quatro dias do mês de maio do dito ano nesta Real Vila de Monte Mor o Novo da América Capitania do Ceará Grande no cartório deste tabelião apareceram as partes presentes, contraentes, outorgantes e bastantes a saber de um lado como vendedor Antonio da Costa Vieira morador na serra da Uruburetama termo da vila a Fortaleza e da outra como comprador João Ferreira da Silva morador na ribeira do Canindé termo desta vila pessoas por mim conhecidas pelas própria de que faço menção e de que dou fé e maiores de vinte e cinco anos(c). E logo pelo vendedor  Antonio da Costa Vieira me foi dito em presença das testemunhas assinadas no fim e nomeadas que entre os demais bens que possuia de mansa e pacífica posse e bens de raiz sem contradição de pessoa alguma um sítio de plantar na serra da Pindoba no rio do meio ou riacho da Pindoba termo desta Real Vila cujo sitio houve por compra a Simão Rodrigues(d)  

(c) Frisa-se aqui idade mínima de 25 anos para se comprar-vender imóvel no Brasil colônia, outrossim, as naturalidades do vendedor e comprador, Uruburetama e Canindé. 

- A estrada que antigamente demandava à Fortaleza desde o Canindé seguia pelas ribeiras dos rios Canindé até o rio Curú indo à jusante até a atual cidade de São Luís do Curú. Dali à esquerda (oeste) tomava-se a estrada para a Uruburetama e São Francisco, atual Itapagé. (Não sem razão ser o Sargento-mor Francisco Xavier de Medeiros doador do patrimônio e principal criador da devoção à São Francisco do Canindé originário da Uruburetama). Para a Fortaleza rumava-se leste via os municípios de Croatá e São Gonçalo do Amarante;

(d) Já em 1804 o sítio Pindoba na Aratuba passara por no mínimo 03 (três) proprietários. Para se ter ainda uma vaga ideia de quão antiga é a Pindoba bastante será verificar as inúmeras desobrigas lá realizadas e constantes do livro de Capelania de São José de Ribamar do Aquiraz iniciando na sétima decúria do século XVIII.

- Para Guaramiranga a antiga Vila de Nossa Senhora da Conceição nada se buscava, o trajeto era um blind-alley. Até o penúltimo lustro do século XVIII não existia sequer uma mísera conexão viária até a atual zona urbana de Guaramiranga e destas aos sertões. Nenhuma importância estratégica, além de penoso e íngreme acesso.

De mais, a mais, não havia qualquer premência para o sertanejo que ia “salvar o gado” em subir a serra pelo barlavento, i.e.: Pela face da Vila do Baturité. O pasto no pé da serra era deveras formidável, além de amplo, anchíssimo! Lá os rios-riachos Castro, Curimatã, Boa Vista, Do Padre, Lagoa Nova, Putiú, Jordão, Nilo, Aracauba (sic), Candeia dentre outros regatos saciavam o gado. Multiplicavam-se as plantações de cana-de-açúcar para alimentar as fornalhas dos numerosos engenhos que fervilhavam na serra produzindo açúcar, rapadura, alfenim e mel enquanto os aviamentos laboravam para que a farinha do Baturité fosse uma das mais disputadas por todos os os sertões central e norte cearense. Couro, Leite, Queijo, Carnes secas e Algodão eram trazidos dos sertões. Todavia a sotavento, na face oeste da serra faceando, os sertões o Maciço do Baturité caprichosamente como crudelíssimo padrasto dava as espaduas. Mirravam-se os sertanejos ao talante de uma madrasta canícula.

Prestou-se o exato local da zona urbana da Aratuba como pouso e preparativo para os tropeiros vindos da região da então Vila do Baturité para a travessia daqueles ínvios sertões até a povoação mais próxima, a Vila de São Francisco das Chagas do Canindé.


                              A cognitio summarium


Quadro de distâncias:

01) Baturité para Canindé (via Mulungú) = 78 Km;

02) Baturité para Pindoba (via Putiú) = 5,0 Km;

03) Pindoba para o centro urbano da Aratuba =  6,0 Km;

04) Baturité para Canindé (via Aratuba) = 46 Km; 

05)  Sitio Flexeiras para o centro urbano da Aratuba (via Aningas) = 3,5 Km


Alia controversia


Percebemos que até o presente instante a história da fundação da sede municipal da Aratuba não foi estadiada. Pesquisadores que tem se esforçado de forma séria e compromissada para resolver esta pendência tem sido os eminentes Srs. Henrique Germano e Gildo Gomes, destacados intelectuais daquele município que nos instaram e desafiaram a destrincar este aranzel.

Repete-se na Aratuba por décadas a fio uma estória que se tem tornado fato consumado de que o sítio Coité, berço e epicentro da sede daquele município fora assentado pelo “Cap João José Pereira(*) com 10 escravos que lá chegaram a 1829”(sic)

(*) João José Pereira, (não sabemos sobre a patente de Capitão como quer a TO aratubense). Ele nascido em 1795, quinto filho do casal José Antonio Pereira e Antonia Maria do Carmo Ferreira. Em primeiras núpcias João José Pereira casou-se com Felicidade Maria da Purificação,  e depois com Francisca do Carmo Pereira, filha de José Joaquim Pereira Leite e Josefa Maria do Carmo (apud Raimundo Torcápio).

Quanto a irresolução do fundador daquela nucleação urbana nunca faltou aventureiros na ciência de Heródoto querendo impor a fábula de que a mui egrégia família Pereira proveniente do Cascavel estabelecida nas ribeiras do Cangati foi a pioneira a habitar a Aratuba.

Dessarte, é que devidamente albergados por documentação bastante, outrossim, pelas evidências históricas é que passamos expomos as seguintes considerações:

- Considerando que em 1804 o então Alferes Antonio Ferreira da Cruz tinha descoberto e morava no seu sítio Flexeiras distante, míseros 3,7 km da atual sede municipal;

- Considerando que os atuais locais do Cantinho, Canoéis, Japão, Sousa, Silva, Gameleira, Matas, Lagoa, São João e Flexeiras na Aratuba, comumente o Catolé, Araticum e Coió no Mulungú no final do Séc XVIII já eram bem povoados e distantes em média 7,5 Km da sede municipal da Aratuba;

- Considerando que logo no primeiro lustro do séc. XIX os retrocitados locais estavam povoados por diversos páter-famílias, além do Capitão Antonio Ferreira da Cruz (descobridor), e.g.: Francisco do Rego Barros; Agostinho e José Leitão, Leão Amorim de Sá, Inácio José Teixeira, Antonio José Moreira Gomes, Brás Ferreira e mais diversos;

- Considerando as inúmeras escrituras de doações, vendas e compras dos sobreditos locais insculpidas nos livros cartoriais do Baturité em 1803/1804 elencando os sobreditos vendedores e compradores;

E pelos considerandos acima resta pueril deduzir que todos os retro nominados pioneiros precederam, em muito, ao Cap João José Pereira(1) na Aratuba.

Bom alvitre também memorar que estes moradores nasceram pelo menos antes de 1779, pois, clara a legislação reinol determinando a idade minima de 25 anos para a venda-compra-doação de imóveis na colônia.

Leiamos aqui as duas mais importantes assertivas da lavra do Sr. Arlindo da Cunha Medina, nascido no Pacoti, na mais antiga coleção historiográfica sobre a Aratuba:

O Álbum do Congresso Eucarístico de 1945 em que ele discorre sobre a fundação da Aratuba:

01) Que a família Pereira chegou em 1829 na Aratuba;

- Compulsando os documentos disponíveis do início do século XIX nada encontramos que corroborasse com este alvitre, sejam provas cartoriais ou eclesiásticas, nihil ex nihilo existit. E se lá chegaram neste ano certamente já encontraram o casal Pedro de Barros e Clara Maria, posto que a filha Josefa lá no Coité nascera aos 15/12/1825 sendo batizada na Matriz de Nossa Senhora da Palma do Baturité aos 18/01/1827. 

02) Que João José Pereira e sua esposa, "Antonia Maria da Conceição"(?), doaram as terras a São Francisco de Paula em 07/09/1863.

- Convencionou-se quanto à primazia da inauguração de um burgo o doador do patrimônio ao orago ou ao padroeiro. Com justa razão é o Sr. João José Pereira o fundador da Aratuba, todavia nunca seu primeiro ou centésimo habitante!

Como lídimo também é constar João José Pereira no elenco dos ádvenas na Aratuba se comparados aos páter-famílias residentes nos locais supram informados.

Inconteste que o Cap Antonio Ferreira da Cruz lá residia há mais de meio século em diminutos 2,5 Km em linha reta da atual sede municipal! Outrossim, não há como se olvidar que este mesmo capitão cruzava o Coité para deslocar-se à sua fazenda de criar nos sertões do Canindé, invariavelmente no quadrimestre chuvoso.

E em relação ao Sitio Coité tido como embrião da formação urbana da Aratuba “construído por João José Pereira juntamente com 10 escravos que lá chegaram a 1829”?

Afinal foi ele o edificador e proprietário do sítio Coité, plântula daquela urbe como tem insistido, à exaustão a tradição oral?

 

Diante da fonte primária falece a lenda


Abaixo carreamos o documento que líquida esta lenda que teima em perpertua-se.

Inventário procedido aos 07/11/1855 pelo falecimento do Sr. João Amaro Abade ocorrido aos 04/10/1841 ab-intestato, sendo inventariante e meeira, a viúva D. Joana Peregrina de Santiago, -letrada, pois, assinou de próprio punho no inventário-, moradores em cima da Serra do Baturité deste termo no lugar e sítio Coité.

Filhos:

1) José Amaro de Araújo (casado);

2) Francisca Maria (casada com Francisco Barroso);

3) Maria Francisca (casada com Martinho Luis de Medeiros);

4) Ana Rosa (casada com Luis Barroso de Sousa);

5) Isabel Maria (casada com João Antonio Nogueira);

6) Antonia Maria (casada com Anastácio José Nogueira);

7) Úrsula Maria da Conceição (solteira de 23 anos);

8) Josefa Maria (solteira de 22 anos);

9) Maria Joana (solteira de 18 anos);

10) Teresa Maria de Jesus (solteira de 14 anos);

- Todos os retro indigitados encontram-se registrando o Sítio Coité legado em 1856 nos Livros de Registro de Terra do Baturité, exceção única do casal Francisca Maria e Francisco Barroso.

- Nenhum registro de terras, tanto no Baturité como no Canindé dá o Cap João José Pereira como proprietário de qualquer imóvel no maciço do Baturité!

Deslindadas algumas das idades dos filhos do casal em 1855, e estimando a média de dois anos e meio entre o nascimento dos rebentos e considerando possuir João Amaro Abade 20 anos quando do seu casamento, teríamos sua natividade estimada para 1770, pouco mais ou menos, portanto, pelo menos 25 anos mais velho do que o Cap João José Pereira nascido em meses de 1795, apud Raimundo Torcápio. Uma geração inteira!

Após tantas discussões, inúmeras querelas, incontáveis disputas por mais de 150 anos temos a honra de reconstruir a imagem geográfica da Aratuba em seus primórdios após compulsar este documento de importância capital para a historiografia daquela cidade. Praticamente a certidão de nascimento do menino Coité. Documento que brada para se ver apregoado em local de destaque no mais distinto edifício do poder público aratubense.

Inventariante: Dona Joana Peregrina de Santiago. Bem de raiz: Sítio Coité, avaliado em 500$000 (Quinhentos mil réis)*.  

“Declarou a inventariante e meeira haver de seu casal uma légua de terra no riacho Coité que houveram por compra que extrema da parte do nascente com uma gameleira com terras de Manoel Felipe Castelo Branco, na parte do poente com Matias Gomes de Matos, numa cachoeira grande, da parte do norte com Antonio de Barros, Florêncio Cavalcante e Romualda, da parte do sul com Bernardo de tal (**) e Antonio Marculino com todas as suas águas, sendo a metade seca e a metade murchada que foi avaliada na importância de quinhentos mil reis, sendo a terra fresca que digo na importância a uma légua fresca de quatrocentos e cinquenta mil reis que vão a margem. Avaliaram um légua seca  na quantia de duzentos mil reis que vão a margem. Declarou a inventariante que dessa terra que deu a descrição no lado de cima na extrema da cachoeira grande vendeu uma pequena parte a José Leonardo pelo preço de dez mil reis e junto ao mesmo pedaço vendeu outra porção dessa mesma terra pela quantia de duzentos mil reis a José Cavalcante sendo as extremas da pequena parte a José Leonardo. Seguintes: Da parte de baixo da cachoeira grande, da parte de baixo no lombo de um alto que vem da parte do nascente onde faz barra no riacho de Manoel Gomes só por uma banda do riacho Coité para o lado do nascente ficando a mesma inventariante com a mais terra que tenm na linha da serra para oura banda, digo, com a mais terra que tem por detras do alto, sendo a extrema da segunda venda feita a José Cavalcante da parte do poente onde faz barra com o mesmo riacho do Manoel Gomes, extremando com outro comprador José Leonardo, da parte do nascente entre duas pedras que no meio tem um pé de cajazeira, contando dali rumo direito a linha da primeira serra que se encontrar para a banda do nascente com as águas que dependem para dentro da mesma terra, da parte do norte entre os riachos do dito Manoel Gomes e da Romualda, com as águas que correm da linha de uma serra que fica na frente da parte norte para a terra vendida, e da parte sul extrema com terras do primeiro comprador José Leonardo”. 

(*) Vultuosa monta à epoca. Para se ter uma ideia do magno valor desta propriedade, mesmo considerando sua subavaliação em face do inventário em comento, o sítio Guaramiranga, o mais importante dianteiro daquela urbe foi vendido aos 26/07/1853 por 200$000 (Duzentos mil réis), sendo os vendedores: Francisco Xavier da Cruz e Francisco Alves Pinheiro, e o comprador: João Batista Alves de Lima. Como parte do pagamento o comprador pagou à vista 180$000 (Cento e oitenta mil réis) mais 15 vacas paridas sendo cada vaca no importe  de  1$000 (Um mil réis).  

(**) "Bernardo de tal", leia-se Bernardo Ribeiro Campos, vide registro de terras do Baturité nº: 1761 de 23/01/1858. Bernardo Ribeiro Campos nasceu em meses de 1801 no Quixeramobim,  ele bisneto do sesmeiro e fundador do Umari-CE. o português, Ten-Cel Manoel Ribeiro Campos e Ana Maria Soares. Com toda ironia deste planeta, nosso colateral paterno. Repete-se o adágio alhures desta postagem de que (Todos cearenses, mais cedo ou mais tarde, se "reuniam" no Baturité).  


Os mais antigos proprietários do Coité


A viúva e meeira Joana da Silva Peregrina de Santiago na escrituração de sua meação no livro dos registros  de terras do Baturité em 1858 indigita  os nomes dos mais remotos proprietários do sítio Coité. Registro de terra do Baturité nº: 1761, ipsis litteris-ipsis verbis: 


"Joanna Peregrina da Silva Sam Tiago possue na Freguesia de Baturité um sitio denominado Coité, que houve por compra ao Senhor João Nunes da Rocha(*) e Francisco Coité(**) extremando da parte do Nascente com terras de José Alexandre Castello-branco; pela parte do Poente com terras d’Antonio Ribeiro de Salles, d’ua banda do riacho, e da outra parte com Justino de Meneses; da parte do Sul com terras de Bernardo Ribeiro Campos, e o Tenente Coronel André Epiphanio Ferreira Lima; e da parte do Norte com terras de Francisco da Costa, e Florencio Uchoa Cavalcante. Baturité 23 de Janeiro de 1858. Joanna Peregrina da Silva Santiago.  O Vigario Raimundo Francisco Ribeiro." 


(*) João Nunes da Rocha casado com Maria José de Jesus, ele pernambucano natural de Vitória de Santo Antão, filho legítimo de Manoel Nunes Viana e Maria José de Jesus, iguamente pernambucanos e daquela mesma freguesia. Casado que foi com Josefa Maria natural do Baturité, filha legítima do Sgt Mor José dos Santos Silva, português do Porto, freguesia de São Pedro de Rates e Ana Ferreira natural da freguesia do Aquiraz.

(**) Francisco Alexandre Coité  casado com Ludovina Maria da Conceição. Damos notícia desta parelha nos assentos de  batismos das filhas, Rufina em 1848, Maria em 1855, outrossim apadrinhando o párvulo Francisco, índio em 1849, todos na Matriz de Nossa Senhora da Palma no Baturité.  

Fora o Coité durante anos um reles lugarejo de pouso tacanho ao longo da movimentada estrada que ligava o Baturité ao Canindé. Lugar como tantos outros nos topes da Serra do Baturité aqui pontuados, à exaustão. O povoado do Coité veio ganhar impulso apenas depois da ereção de sua Matriz. Trouxeram os religiosos de outrora os fundamentos da instrução. Autêntica obra de evangelização e educação! Este o verdadeiro ministério da S. Igreja: Pregar o SS. Evangelho e cuidar da salvação das almas.


                                        Efemérides


O local do sítio Coité que abrangia praticamente toda zona urbana da atual Aratuba diferenciava dos demais algures citados por sua abundância potâmica e pela circunstância de ser a primeiríssima área plana após as íngremes subida-descida da serra proporcionando descanso para os comboieiros, viajantes e animalia.

Trafegamos neste mesmíssimo caminho na nossa infância em lombo de muares “estralando a macaca” o que ainda sabemos até hoje, conduzindo cargas de rapaduras, alfenins e bananas desde as Flexeiras até a fazenda Santa Cruz no Canindé-Itapiúna ambas pertencentes aos nossos ascendentes, os Ferreira da Cruz.

Conhecemos o quintal da nossa casa à saciedade, circundamos o Maciço do Baturité por todos os seus sertões adjacentes, sopés, flancos e cimos, desde a estrada da Jubaia, Tanques e Ladeira Grande ao norte extrema do Maranguape, como nos contrafortes ao sul, nos Cajuais e Palmatória na Itapiúna.

Em suas vertentes oriental e ocidental colocamos o maciço pelo avesso. Usando motocicleta de trilha moderna e bem preparada subimos pelo Candeia de Cima até o Pacoti uma das escaladas mais difíceis devido às inclinações invariavelmente superiores a 40º.

Saíamos igualmente do Baturité via a estrada das correntes com seus massapês de barro vermelho crudelíssimos à tração em seus caminhos tortuosos sempre rumando oeste alcançavamos os sítios Bagaço, Palmas, Flor, Videl indo até à zona urbana do Mulungú. Vadeávamos os riachos Santa Maria e Nilo saindo na rodovia CE-065 bem no distrito do Lameirão no Mulungú.

Já no lado ocidental não há uma só ladeira que não tenhamos galgado-descido, inclusive a complicada trilha que liga o Pacoti ao Itapebussú pelo Gado dos Ferros.

Estamos sobremodo convictos que até o presente instante nenhuma obra historiográfica que nos precedeu versando sobre a primogênita do Maciço do Baturité possuiu condão elucidativo parelho. 

Temos usado este humílimo espaço para realizar nossas mais relevantes publicações, sempre preterindo os livros físicos, uma vez a PIRATARIA, que, malgrado nosso grassa e desgraça. Pretendemos dar publicidade abrangente no desiderato de alcançar a maior quantidade de interessados nos inéditos da história brasileira e regional aqui despendidos. Estamos sobremaneira realizados, pois, nossa última postagem alcançou a monta de 24 mil acessos após 60 dias de publicada, indício da possibilidade em reverter a tirânica idiotização que o gramcismo submeteu nossa juventude fazendo-a exceder em embrutecimento os irracionais. 


Finis coronat opvs


Experimento gaudium magnum em fazer desta singela postagem humílimo preito de gratidão dedicado exclusivamente ao Revdmo. Pe. Neri Feitosa, a quem não sou digno sequer de limpar suas sandálias; O que dizer então de calçá-las?!

O Revdmo. Pe. Neri Feitosa tem sido uma das maiores erudições da história e genealogia cearense, ou a maior. Agradeço a Deus por ter sido seu conterrâneo e contemporâneo, ato continuo, parafraseio o velho Simeão:  

“Agora, Senhor, podes despedir em paz o teu servo, pois já os meus olhos viram a  luz que Vós preparastes” para alumiar os cronistas, historiadores.

Em suma, A Igreja possui dívida irremível com o Comendador Ananias Arruda, na mesma proporção que a história e genealogia cearense possui com o Revdmo. Pe. Neri Feitosa. 


Brasília-DF 

200127ZAGO22SAB 

Clovis Messias Ferreira da Cruz Ribeiro de Campos Lobo,  PVT E-1 (11B)

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